Este livro nasceu da experiência do Conselho Nacional de Saúde (CNS), principalmente por meio da Comissão Intersetorial de Recursos Humanos e Relações de Trabalho (CIRHRT) e da sua Câmara Técnica, na avaliação da relevância social e sanitária dos cursos da área da saúde como tradução da qualidade tecnopolítica e da sua compatibilidade com as políticas do Sistema Único de Saúde (SUS). A sua 2ª edição, revista e ampliada, expande o leque de experiências nacionais e internacionais que permitem pensar nas formas de regulação pública da formação técnica e profissional, com base nas necessidades de saúde e do direito de acesso a cursos de qualidade. Na versão atual, temos sete capítulos que falam da experiência brasileira de regulação dos cursos da saúde, seja com abordagem histórica, seja contemporânea, sobretudo das iniciativas desenvolvidas pelo Conselho Nacional de Saúde de avaliação da relevância social e sanitária dos cursos, nas diversas fases do ciclo regulatório previstas na legislação. Além da experiência brasileira, dois capítulos recuperam as iniciativas em El Salvador e Argentina. Assim constituída, a coletânea é ainda mais forte para ativar o pensamento e engendrar o movimento social de mudanças na formação, considerando a relevância do trabalho na qualidade da atenção e da gestão na saúde. Também ilustra a ideia, nem tão original, de que o sistema de formação não é o “lado de fora” do sistema de saúde, mas, ao contrário, lhe é constitutivo. Mais ainda, que a formação e o trabalho não são elementos intermediários na ação finalística dos sistemas de saúde, mas, ao contrário, são parte dos resultados, na medida em que trabalhadoras e trabalhadores não são “recursos”, que podem ser manipulados e distribuídos conforme planos prévios, mas agentes políticos que fazem objetivamente a produção da saúde, com seu trabalho, sendo que a formação não é um evento episódico, mas permanente. A produção da saúde, que se faz com trabalho de diferentes agentes nos diversos territórios, é de enorme complexidade, sendo que só pode ser alcançada, parcialmente, se o trabalho estiver inserido em estratégias locais e permanentes de atualização. O referencial mais relevante da qualidade da formação é exatamente a inserção do trabalho e da formação nos sistemas locais, atuando para que também se integrem no desenvolvimento desses sistemas em territórios reais.
Sem estender muito a discussão sobre as diferentes abordagens da educação em relação à qualidade do ensino, para o CNS – e com inspiração nas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) dos cursos da saúde, da Política Nacional de Educação e Desenvolvimento do Trabalho na Saúde (a denominada Política Nacional de Educação Permanente em Saúde – PNEPS), a articulação educação e trabalho é um marcador de excelência da qualidade, considerando a crítica epistemológica sobre a especialização do conhecimento e a fragmentação técnica e profissional no mundo contemporâneo e, sobretudo, reconhecendo a produção da saúde – e, da mesma forma, o trabalho no interior de sistemas, serviços e redes territoriais – como campo de ação complexo.
Assim constituído, o livro é, ao mesmo tempo, um documentário histórico, que atualiza a memória dos esforços institucionais e estratégicos de avaliação e indução à mudança na formação em saúde, considerando a evidência mais visível das mudanças flexnerianas há dois séculos, e um inventário dos esforços atuais. Uma leitura necessária e oportuna para todas as pessoas que, como as organizadoras e os organizadores, compreendem que a formação em saúde deve estar, ao mesmo tempo, conectada como os valores do seu tempo histórico, e, também, comprometida com as mudanças que a renovação dos ciclos civilizatórios e epistêmicos requerem das políticas de educação e saúde.
Mês e ano de publicação: junho de 2024
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